domingo, 9 de agosto de 2015

Coice: “Gosto da ideia de ora entreter, ora causar questionamentos” - Diz Leandro Pitote



Por Bruno Sawyer


A banda paulista de punk nos concedeu uma bela entrevista, onde falou um pouco sobre sua carreira, o novo disco, política, entre outras coisas.




Seu disco de estreia, o autointitulado Coice, foi lançado no início deste ano.

Confira abaixo:

01) É uma honra entrevistá-los. Contem um pouco sobre a formação da banda (quando se juntaram, formação de repertório, entre outros).

Diego: As raízes do Coice remontam à hoje esquecida cena punk do Parque São Domingos nos anos 90. Eu cantava numa banda na qual o Leandro era o baterista. O Marcão cantava em outra. Há anos o Leandro e eu falávamos em voltar a tocar punk. Um dia ele encontrou o Marcão e a banda começou a finalmente tomar forma. Como o Marcão trouxe o Paulo para tocar baixo, eu precisei deixar o baixo de lado e aprender a tocar guitarra (Algo que eu nunca tinha feito antes... "Do It Yourself", literalmente).

Leandro: Minha primeira banda era o Totally Wrong, onde eu era o baterista e o Diego era o vocalista. Bom passou-se alguns anos e a banda acabou, fiquei parado um bom tempo, eu e o Diego sempre falamos em montar outra banda e tal, acabamos montando uma banda de classic rock, onde o Diego tocava baixo. Durou alguns anos.  Fiquei parado um bom tempo, mas o contato com o Diego sempre foi constante. Em certo tempo, reencontrei o Marcão e ele tinha me convidado a pra tocar com ele (e logo nos tornamos grandes amigos) e o Paulo, que era baixista na ocasião, mas aí acabou faltando alguém para tocar guitarra. “Ah vamos chamar o Diego pra tocar com a gente” porem ele não tocava guitarra. Entramos em contato com ele e a coisa foi acontecendo e hoje ele toca guitarra no estilo Punk Rock como poucos.

Marcão: No início de 2013, eu e o Paulo Plevnia estávamos tocando em uma banda cover de Metallica, só por diversão, e queríamos fazer música própria. Eu e o Leandro Corrêa, nessa mesma época, havíamos nos reencontrado depois de muitos anos via Facebook. Resolvemos Paulo, Leandro e eu, nos reunirmos pra fazer um som. Sabia que o Diego tocava baixo num projeto cover de Black Sabbath chamado Kings of Hell. Pensei: "se o mano toca Black Sabbath no baixo, tocar guitarra numa banda punk não vai ser tão difícil pra ele". Assim surgiu a primeira formação do Coice, que começou a ensaiar em abril de 2013. Com a saída do Paulo, que já estava planejando se mudar para a Austrália já havia um tempo, chamamos o Marcus Betioli, outro cara que eu já conhecia fazia tempo por conta de amigos em comum. Já tinha ouvido falar que ele era um ótimo baixista. No primeiro ensaio com o Coice, em 2014, o mano já se encaixou perfeitamente na banda.




02) Quais são suas principais influências?

Diego: Bom, adoro música de todos os estilos (O ecletismo da minha coleção de discos e CDs é assustador), mas eu jamais seria músico se não fosse o Black Sabbath.

Marcus: Todos têm um gosto bem eclético que vai do Jazz, Heavy Metal, Punk passando pelo Groove dos anos setenta, mas o que me fez ir para o baixo foram as bandas inglesas de Heavy Metal.

Leandro: Gosto das grandes bandas de punk rock como Clash, Ramones, Dead Kennedys, Bad Religion, bandas de hardcore como NOFX, Pennywise, Snuff, dos clássicos do rock como Led Zeppelin, Black Sabbath, do grunge como, Pearl Jam, Alice in Chains. Já toquei em banda de reggae, me influenciei muito nos clássicos do gênero como Bob Marley, Peter Tosh, Gregory Isaacs e os clássicos do reggae roots.

Marcão: Mas pro Coice, as influências são mesmo do punk dos Dead Kennedys, Ramones, Black Flag, com um pouco de storner à la Black Sabbath e as bandas nacionais como Garotos Podres, Cólera e Ratos de Porão.



03) Vocês lançaram “Coice” seu disco de estreia há pouco tempo. Falem um pouco sobre o processo de composição. Houve alguma canção que deu mais trabalho para ficar pronta?

Diego: Bom, as músicas do Coice podem ser dividas em três tipos quanto à composição: As que o Marcão compõe as que eu componho e as que surgem nos ensaios a partir da junção de riffs que ou trago ou invento na hora com as letras que o Marcão ou traz ou inventa na hora. A única exceção a esta regra foi "Nunca Mais", canção com os riffs feitos pelo Paulo, o baixista original do grupo. Nenhuma das músicas deu mais trabalho. A coisa fluiu naturalmente.

Leandro: As musicas saem de forma espontânea, um chega com um riff, o outro chega com a letra, e vice versa, aí é que entra o Marcus e eu que vamos montando a musica e acertando o tempo. Montamos a “estrutura” da musica, bom na verdade todos participam de alguma forma.

04) Como vocês veem a cena do punk brasileiro na atualidade?

Marcus: A Cena Punk, como sempre continua no faça você mesmo, tem muita banda se articulando e colocando o movimento pra funcionar. Em uma cidade como SP é muito pouco os picos que abrem espaço pra essa galera.


Marcão: Não tem mais aquela força que tinha nos anos 80 e 90. Tanto que as principais atrações de festivais de punk rock continuam sendo as bandas antigas. Cólera, Olho Seco, Inocentes, Agrotóxico... Muitas vezes essas bandas marcam shows com grupos novos abrindo, e o que acontece é que boa parte do público fica no boteco bebendo e só entra no lugar na hora do show da banda principal. Tem que mudar isso, né? Outra coisa que rolava nos anos 80 é que bandas como Legião Urbana, Ira! e Titãs estavam sempre na mídia, tocando riffs punks. Acho que isso meio que despertava um interesse maior das pessoas para o punk rock brasileiro. Agora o Brasil é o país do sertanejo universitário. É praticamente só isso que a gente vê na TV e que toca nas rádios. O rock foi totalmente deixado de lado pela mídia. Tá certo que a cena punk nunca precisou muito de mídia para rolar, mas o fato de o rock ter mais espaço antigamente ajudava. Hoje, as casas de show que liberam o palco pra bandas punk em São Paulo são muito poucas. Hangar 110 (a mais tradicional), Centro Cultural Zapata, Guaya Pub são algumas delas, mas se outros picos que dão espaço pra nova MPB e bandinhas indie dessem uma forcinha pro punk, não seria nada mal. Mas as bandas novas tão aí, dando duro pra manter o punk rock vivo no Brasil.



05) Como surgiu “Tudo Infestado”?

Diego: "Tudo Infestado" surgiu numa pausa de ensaio. Fiquei sozinho no estúdio enquanto os demais foram tomar uma cerveja. Fiquei brincando com a guitarra e o riff principal da música simplesmente apareceu. Assim que o pessoal voltou comecei a tocar o riff (Principalmente para eu não me esquecer da ideia) e o Marcão encaixou uma letra que ele tinha escrito. Com o tempo, a letra foi mudada para a versão atual e inventei o solo de guitarra e o final da música.

Marcão: É uma música que fala da corrupção dos políticos, né? Um problema histórico no Brasil. E nós, como banda punk, não poderíamos deixar de abordar o tema. Construí a letra a partir do refrão. Pensei em versos que juntassem todos os níveis do poder legislativo e executivo e ainda rimassem. E surgiu: "Ratos, que estão no Senado. E entre os deputados. Governantes, ministros. E seus secretários. Tá tudo infestado!".

06) Entre ensaios e shows acontecem muitas coisas. Há alguma história inusitada que podem contar para nós?

Diego: Bom, antes do Paulo ir para a Austrália, fizemos um ensaio de despedida que acabou numa divertida celebração etílica. De minha parte, devo admitir que foi um desafio hercúleo conseguir tocar guitarra a partir de uma certa altura do campeonato...

Leandro: Esse dia foi memorável, pois nos permitimos tocar na maior “piração” etílica. Saíram muitas ideias legais, algumas deram forma e hoje viraram algumas de nossas musicas.

07) O rock é um gênero que dá voz aos excluídos desde o começo. No caso do punk rock, os protestos sociais e as críticas à política são características marcantes. Como vocês enxergam o cenário político/social do Brasil atual?

Diego: Bom, penso que vivemos tempos interessantes e fervilhantes. Como artista, pessoalmente, sinto-me mais interessado nas perguntas do que nas respostas. Gosto da ideia de ora entreter, ora causar questionamentos.

Leandro: Estamos passando por uma época meio conturbada. Nossa musica é a forma que encontramos para expressar o que sentimos quando vemos algo que nos incomoda, ou dando um alerta para as pessoas que nossos recursos naturais estão se esgotando... Acho que é isso! O Punk Rock é a forma que encontramos de forma objetiva para se expressar.

Marcus: Estamos vivendo um período que o conservadorismo e o fundamentalismo religioso estão presentes no congresso de uma forma muito perigosa. Essa galera de direita se sente representada no meio político. O punk é um movimento cultural que tem que ser contra esse tipo de manifestação. O movimento punk tem que ser critico ao ufanismo, a homofobia, a misoginia, a qualquer tipo de preconceito com as minorias.

Marcão: Sim, é função do punk expor e ridicularizar os imbecis fascistas, que tão aí, fazendo marcha na avenida Paulista contra o “comunismo”. Bando de idiotas. Pra esse pessoal a gente fez uma música nova, que pretendemos gravar em breve. Chama-se "Fascista Paulista", porque esse povo reacinha, movimento Proteste Já, em companhia, se concentra principalmente em São Paulo -- taí Geraldo Alckmin ganhando no primeiro turno, coronel Telhada sendo o deputado mais votado e indicado pra comissão de direitos humanos, “Feliciânus” (Pastor Marcos Feliciano, deputado federal) tendo uma votação esmagadora em SP. Isso nos irrita profundamente, pois, afinal, todos da banda são paulistas.

08) Ser artista independente é bom?

Diego: Penso que melhor coisa de ser um artista independente é a liberdade que temos de fazer o som que queremos fazer.

Marcus: Poder criticar quem tem que ser criticado e de uma forma contundente. O punk tem que ser independente.

Leandro: Eu acredito em que se estando na independência, ficamos livres para fazer nossa musica da forma que quiser, sem interferência externa.

Marcão:  Olha, na minha opinião, ser artista independente é bom pelos aspectos que meus colegas acabaram de citar. Por outro lado, não dá pra um artista independente, principalmente que toca rock, sobreviver hoje só com a banda. Eu particularmente, gostaria de ter mais tempo pra ficar compondo, organizando shows, gravando etc. Mas o Coice não é a principal atividade de nenhum dos integrantes. Todos nós temos nossos empregos, às vezes precisamos trabalhar de fim de semana, entrar no trampo muito cedo. E isso atrapalha. Impede a gente de ensaiar, fazer shows. Se a gente pelo menos conseguisse pagar nossas contas com o Coice, pode crer que já teríamos muito mais discos e feito muito mais shows.

09) Deixem um recado para os fãs.

Diego: Agradecemos a todos os que nos prestigiam. Sem vocês nada seríamos. E, se tiverem interesse, podem entrar em contato com a gente via nosso Facebook, e – mail ou canal do Youtube:


10) Muito obrigado pela entrevista e agora é a sua vez. Perguntem-me o que quiserem!

Coice: Quem vocês gostariam de entrevistar e ainda não entrevistaram?  Se vocês pudessem fazer somente uma pergunta para este entrevistado, qual seria a indagação? Se souberem de um espaço pra gente tocar ou de um festival que possam nos encaixar, vocês avisam? (Risos)

Bruno: Olha pessoal, eu parei pra pensar aqui e há vários! (Risos) Mas um cara que eu gostaria de entrevistar é um dos mestres que começou tudo isso que a gente curte, o grande Chuck Berry. Provavelmente perguntaria para ele se algum dia lhe passara pela cabeça que seria um dos pais do rock’n’roll.

E, com certeza, quando eu souber de algo e puder ajudar eu aviso!

Muito obrigado!


Dossiê do Rock: Revelando o passado. Incentivando o futuro.