Tivemos uma conversa tão
produtiva com Fátima Taffo (Fafau), irmã de Wander, que decidimos fazer um especial para
homenagear esse mestre da guitarra.
Aqui abordaremos a vida pessoal do músico, sempre contando com a presença dos relatos dela.
Wander era um cara espirituoso e não foi apelidado de mestre à toa, pois sua humildade era proporcional ao seu conhecimento musical.
Confira abaixo a primeira
parte dessa homenagem que fizemos a um dos maiores guitarristas brasileiros, o
saudoso Wander Taffo.
Por Criss Cesar
Wanderley Taffo Junior
nasceu em 17 de maio de 1954, em São Paulo. Filho da Cantora Rosa Pardini e do
clarinetista e flautista Wanderley Taffo. Já bem pequeno costumava ir a
programas de TV, juntamente com sua irmã gêmea Maria de Fátima, acompanhando
sua mãe.
‘O
legendário Almoço com as Estrelas recebia-nos com uma pilha de livros nas
cadeiras, para que alcançassemos a altura da mesa e pudessemos aparecer.’ - conta
Fátima (Fafau, a gêmea do ‘brother’) em seu livro lançado após a morte do
irmão.
Seus pais se separaram ainda
na década de 50 e Wander teve contatos esporádicos com o pai. Sua mãe se casou
novamente com aquele que seria o ‘pai padrasto’ dos gêmeos, Guilherme.
Na adolescência, tocava
violão com sua irmã, e foi quando ganhou sua primeira guitarra, presente de sua
mãe. Na década de 70 foi convidado para fazer parte da banda Memphis, por
Nescau, seu amigo de infância, que era baixista da mesma.
Essa formação trazia
Nescau, Wander (guitarra), Gel Fernandes (bateria), Helio (teclados) e
Dudu França (vocal). Foi com a Memphis que Wander se apresentou pela primeira
vez num palco, aos 17 anos.
‘Gel
tinha uma certa preocupação com a entrada do Wander, ainda um músico
inexperiente. Mas chegando ao primeiro ensaio dessa nova formação (...)
surpreendeu-se com a execução de uma música do Yes. Era o Wander dedilhando uma
de suas preferidas’ - lembra Fafau em seu livro.
Taffo não recebia muito apoio
do padrasto, que temia pelo futuro duvidoso que ele teria no mundo musical.
O 'brother' acabou saindo de casa, mas sempre encarando a vida com bom humor e
bondade.
Na escola aprontava bastante
e era querido por todos, inclusive pela diretora do colégio. Já ficava claro a
essência alegre do ‘brother’. Nessa época, Wander já assistia a alguns ensaios
dos Mutantes.
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Wander Taffo à esquerda no Secos e Molhados |
Tocou com Made In Brazil,
Joelho de Porco e Secos e Molhados. Mas Wander tinha o sonho de ter sua própria
banda. Montou com Gel a banda Sobrinhos da Rainha e fazia parte da banda de Wanderley
Cardoso. Posteriormente tocou com a Gang 90 e As Absurdetes, banda com a qual
se apresentou no MPB Shell, em 1981. A banda foi premiada pela música Perdidos
na Selva.
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Wander Taffo (de calça vermelha) com o Made In Brazil para uma campanha da Ellus em 1977 |
Aos 25 anos ele perdeu o pai
biológico e iniciou sua história de amor com Marcinha, uma modelo de revistas na
época que Wander conhecia desde seus 18 anos. Nessa mesma época, ele começou
a tocar com a Rita Lee, casou com Marcinha ‘(...)
e nem teve lua de mel direito, pois saiu em viagem com a banda da Rita,
apresentando o show do álbum Lança Perfume.’ - diz Fafau.
Em 1981 nasceu Livia, sua
primeira filha, o que aumentou sua vontade de ter seu trabalho próprio, movido
pela vontade de estar mais com sua nova família.
O pai padrasto aceitava a
seu modo a carreira do filho e percebia que, apesar do receio, as coisas
estavam caminhando e Wander estava feliz e encarava tudo com bom humor, como
sempre. Seu lema preferido: alegria solta no ar.
Ainda com Rita Lee, Wander
gravou o álbum Saúde (1981) e fez a turnê de promoção do disco. Neste mesmo ano
ele, Gel e Lee Marcucci (baixista da banda de Rita Lee) se unem para um novo
projeto. Eles, somados a Willie, formaram o Radio Taxi.
Após a gravação do primeiro
álbum, Willie deixou a banda e Mauricio Gasperini, que tinha acabado de ganhar
o FICO, festival interno do colégio Objetivo, assumiu os vocais. Com Mauricio, o
Radio Taxi gravou mais 03 álbuns.
Nessa época a esposa de
Wander sofreu um aborto espontâneo no terceiro mês de gestação, fato que deixou
o músico bem abalado.
Em 1987, com alguns sócios, Wander
abriu o IGT, uma escola de música nos moldes do GIT, Guitar Institute of
Technology de Los Angeles. Localizada na av. República do Líbano em São Paulo,
contava com uma estrutura de ponta. Mozart Mello, amigo de Wander desde a
adolescência, coordenava a escola e também dava aulas junto com Taffo, Faíska
(que tocou com Joelho de Porco e acompanhou diversos músicos como Ney Matogrosso,
Fagner e Fabio Jr.) e outros professores. Mas a escola fechou uns dois anos depois. Ali
estudaram Kiko Loureiro e Eduardo Ardanuy.
Ardanuy já tocava na
banda Anjos da Noite e Wander, que sempre admirou o guitarrista, o convidou
para tocar em seu novo trabalho solo. Ele havia acabado de assinar com a WEA
(Warner), uma das maiores gravadoras da época, que gostaria que Wander montasse
uma espécie de power trio. Assim,
Ardanuy o apresentou aos irmãos Busic, Andria (baixo) e Ivan (bateria). Surgiu,
neste momento, a banda Wander Taffo.
Wander sempre foi antenado
em tecnologia e repaginava o som de qualquer instrumento. Em suas viagens para
Nova Iorque sempre trazia muitas novidades. Sérgio Reis, pai de Marco Bavini,
vocalista do Anjos da Noite, comprou todos os equipamentos de sua banda
seguindo as indicações de Wander.
Para se dedicar a carreira
de músico, Wander teve que se afastar da escola, o que gerou o fim da sociedade
na IGT e a escola fechou.
No final de 1988, Taffo convidou Fafau para trabalhar com ele como produtora de shows. Ele estava se
divorciando e talvez a presença da irmã por perto o ajudasse a atravessar esse
momento difícil. No início de 1989, com sua mãe e Fafau, ele iniciou seus
estudos espiritualistas. Era a busca da força interior, o autoconhecimento. E
foi assim que surgiu a Rosa Branca, símbolo do segundo álbum solo da banda Wander
Taffo, que inclusive dá nome ao disco e nos faz lembrar do guitarrista até
hoje.
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Ivan Busic, Wander Taffo e Andria Busic - Banda Wander Taffo |
O disco saiu do forno em
junho de 1989 e ganhou o Prêmio Sharp de Revelação do ano. Tinha participações
especiais como Lulu Santos e Lobão. A banda tocou em espaços como Dama Xoc e
Aeroanta, mas mesmo assim o disco não vendeu. Inspirados pela Rosa Branca
fizeram um álbum que foi gravado pela CBS e falava de amor, de autoajuda e de
transformações pessoais.
‘Olhos de neon não são olhos de uma moça. É a luz interior de cada um. A
nudez em ‘Me dê sua mão’ traz a ideia de você se despindo do seu ego.’ - diz
Fafau, que compunha para Taffo.
A banda Wander Taffo se tornou
banda Taffo, passou a contar com os teclados de Marcelo Souss e ganhou muitos
fãs.
‘Conseguimos
atingir um bom número de fãs, que alimentavam nossa caixa postal no Aeroporto
de Congonhas com mais de 100 cartas semanais, que eram respondidas uma a uma, à
mão e coração.’ - escreve Fafau em seu livro.
Curado da separação, Wander
conheceu Mônica Lima durante um show no Dama Xoc e em poucos meses estavam morando
juntos. Por ser 16 anos mais nova que o brother, Mônica trouxe uma energia
revigorante a essa nova etapa da vida dele.
A banda fez apresentações no
Brasil e no Limelight e Catclub em Nova Iorque, com gravação
para a MTV transmitida para diversos países. Eles fizeram esses shows em inglês
e só não lançaram o White Rose por falta de grana.
Na sequencia, foram convidados
para abrir os shows de Ian Gillan no Brasil. Eram disputados para apresentações
nas rádios da época, como 97, 89 e Brasil 2000, e estavam sempre presentes no
‘Programa Livre’.
Em 92, com a saída dos
irmãos Busic, a banda seguiu com Fernando Nova (vocal), Carlos D’Angelo (baixo)
e Gel Fernandes (bateria) e gravaram Nagual, um álbum inspirado na obra do autor
peruano Carlos Castañeda. Porém o disco não chegou a ser lançado.
O Brasil vivia um momento
musical novo, com a chegada do sertanejo e do axé, o rock perdeu
força e Wander voltou a dar aulas e a fazer shows com Rita Lee e a banda Taffo
deu seus últimos suspiros.
Mesmo nesse momento de
dificuldade, Wander não desanimava. Estava sempre feliz, positivo e nunca vacilava.
Nessa época participou de trabalhos com Marina Lima, Arnaldo Baptista,
Guilherme Arantes, Cassia Eller e outros.
Em 1995 a vida renasce com a
chegada do segundo filho de Wander, Lucas, que dá um novo gás ao ‘brother’. No
ano seguinte ele lançou o disco ‘Lola’, cuja faixa título tinha letra de Roger
do Ultraje a Rigor. Uma outra faixa, ‘Sempre junto de você’, fez parte da
trilha sonora da novela ‘O Amor Está No Ar’ da Rede Globo.
Em 1997, junto com Celio
Ramos, na época dono da casa de shows Britânia, abriu novamente a IGT, desta
vez no bairro do Jabaquara. ‘Foi uma
união muito feliz. Wander sempre foi muito obstinado e queria passar para todos
seus conhecimentos’ - diz Fafau.
Wander sabia que para ser um
bom músico era preciso praticar, não desistir, treinar e treinar sem parar. Era
um trabalho árduo. Passou a fazer workshops
que eram muito concorridos.
‘Na
famosa Clínica do Doutor Taffo, ele aparecia com um avental branco,
estetoscópio e receituário. Nas receitas colocava, por exemplo, pratique
alternadiol plus por uma hora todo dia...’ - conta Fafau em suas
memórias.
Ainda em 1997, Wander, a
convite de Eurico Pellegrino, passou a fazer parte da produção do FICO e compôs
a música de abertura do festival.
Em 1999, a escola mudou
endereço e se instalou num espaço bem maior. Além disso, a escola ganhou um
novo nome, Escola de Música e Tecnologia (EM&T), pois lá não se lecionava
apenas guitarra, mas outros instrumentos também, como violão, baixo, canto,
bateria e gaita, além de cursos para produção e gravação musical.
Com a ajuda de novos
parceiros como C&A, Giannini, Radio MIX, Colégio Objetivo, PlayTech e
Tagima, que sempre apoiaram a EMT, a escola ganhou um anfiteatro, por onde
já passaram grandes nomes da música nacional e internacional, como Pepeu Gomes,
Zizi Possi, Jane Duboc, Rafael Bittencourt, Ian Pace, Joey Lynn Turner, Buddy
Guy, Steve Morse entre muitos outros.
Em 2004 o Radio Taxi se
reuniu. Em 2005 gravaram um DVD ao vivo, marcando a volta da banda e no mesmo
ano Wander desenvolveu com a Giannini uma guitarra com sua assinatura, a Power
Signature Giannini Rosa Branca.
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Taffo e a sua power signature Giannini Rosa Branca |
Em 2008 ele estava se
preparando para voltar com a banda Taffo. Já havia regravações e músicas novas.
Wander, Marcelo Souss, Fábio Zaganin e Christiano Rocha já estavam ensaiando e
a procura de um vocalista, quando o ‘brother’ abandonou os palcos dessa vida e foi
tocar num outro plano.
No dia 14 de maio, às
vésperas de completar 55 anos, Wander sofreu um enfarto fulminante em casa.
No ano seguinte sua mãe foi para o outro plano encontrar o filho querido.
No ano seguinte sua mãe foi para o outro plano encontrar o filho querido.
Monica administra a
EM&T até hoje e continua fazendo um belíssimo trabalho.
Lucas, seu filho, tem hoje
20 anos e segue os passos do pai, tocando e se aperfeiçoando na guitarra.
Fafau escreveu um livro chamado
Wander Taffo – Irresistível coração de
menino, contando a trajetória de seu gêmeo, mostrando a todos porque muitos
músicos o chamavam de mestre, e ainda se referem a ele dessa forma, e
transformando os leitores em brothers de Wander.
No dia 30 de setembro, a partir das 21:30, ocorrerá a terceira edição do tributo realizado para Wander Taffo. O evento acontecerá no Bourbon Street, localizado na Rua dos Chanés, 127 - Moema, São Paulo/SP.
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