Por Bruno Sawyer
O capiroto (como é carinhosamente chamado pelos fãs)
gentilmente nos concedeu uma entrevista muito bacana.
Ele falou sobre sua carreira, novos planos como artista
solo, a gravação de seu DVD no próximo dia 13 de janeiro no Café Piu-Piu em São Paulo, da sua relação com o bom humor e contou histórias engraçadíssimas!
Confira abaixo a ótima entrevista com Rafael Bittencourt:
01 -
É uma honra entrevistá-lo. Você já é um músico renomado e sabemos de toda a
exposição que o sucesso causa, mas eu quero ouvir de você: Quem é Rafael
Bittencourt?
Rafael:
Eu
sou um músico. Fundador do Angra, guitarrista, fundador do Bittencourt Project
e, sobretudo, um sonhador. Todos os meus projetos são frutos de devaneios
histéricos, criativos, de uma compulsão que eu não consigo conter. Muitas vezes
não são pensados, elaborados de uma maneira lógica, mas são urgências,
necessidades que eu tenho de colocar as minhas ideias na forma de músicas,
letras... Muitas vezes comportamento, e compartilhar isso com as pessoas.
02 -
Durante a pausa que o Angra teve entre os discos Aurora Consurgens e Aqua você
lançou o Brainworms I, seu primeiro disco solo. Quando você decidiu que era o
momento de lançar um disco solo?
Rafael:
Esse
disco veio num momento de grande transformação na minha vida, pois eu estava
saindo de um casamento, a banda estava tendo mudanças na sua formação, eu
estava tendo brigas e discussões com o antigo empresário do Angra (o que também
levou ao fim do trabalho da banda com ele) e o Brainworms I foi um documento
desta transformação. É um disco bastante autobiográfico que funcionou como um
diário musical das coisas que eu estava vivendo. Obviamente eu finalizei
músicas que eu já tinha, mas com toda a emoção de querer construir algo, pra
mim, que não fosse diretamente dependente do Angra.
03 -
Sobre o processo de composição e gravação desse disco, como se desenvolveu? As
canções fluíram bem ou teve alguma que deu mais trabalho pra finalizar da forma
que você queria?
Rafael:
O
Brainworms I nasceu de uma urgência muito grande de eu dizer coisas que eu
estava sentindo, por isso elaborar as músicas não deu muito trabalho. Como eu o
fiz pensando em algo semelhante a um desabafo musical, eu aproveitei o tempo
durante o processo pra saborear e me deliciar com o prazer de estar pondo pra
fora tantas emoções, tantos sonhos e tantas vontades realizadas.
04 -
Sobre o novo DVD, cuja gravação ocorrerá no dia 13 de janeiro de 2016, no Café
Piu-Piu em São Paulo. Haverá alguma participação especial no show?
Rafael:
O
Edu Falaschi e o Edu Ardanuy toparam participar do meu DVD e isso me traz muita
felicidade.
05 -
As plataformas de crowdfunding se tornaram agentes importantes na viabilização
de projetos independentes. Como você vê isso?
Rafael:
O
crowdfunding é uma plataforma que abrirá muitas portas para os artistas
brasileiros. É essencial que estes percebam a importância disso.
Em muitos países esta plataforma já é muito utilizada e
por ser novo aqui no Brasil muitos ainda pensam ser um recurso de artista
falido, mas este é um grande engano, pois, na verdade, é a possibilidade de o
artista e o público criarem uma sociedade, uma parceria, no conteúdo e no
financiamento do produto.
É muito importante o público entender que ele é parte da
obra e que hoje em dia ele escolhe o que vai consumir. Ele pode esperar a
grande mídia lhe trazer algo e, nesse caso, vai ter que aceitar o que é
trazido, ou ajudar a financiar o que ele realmente gosta, contribuindo pro
artista que dá voz aos seus sentimentos mais interiores.
Isto é uma grande revolução na maneira de se fazer arte.
Hoje o público é agente ativo das manifestações culturais, ele não precisa
ficar esperando os grandes detentores do poder da comunicação, das grandes
gravadoras e canais e televisão pra ter acesso ao artista que gosta, porque ele
mesmo pode contribuir e participar diretamente do produto ajudando a moldar e a
construir a cena cultural, seja de rock ou de qualquer outra manifestação à
maneira que ele acredita e que vislumbra. Não dá mais pro público reclamar do
que aparece na TV, pois hoje ele pode mudar, ele pode cooperar com o artista
que ele gosta através do crowdfunding.
06 -
Você pretende dedicar mais tempo para sua carreira solo? Há a possibilidade de
lançar um sucessor do Brainworms I?
Rafael:
Sim,
eu pretendo me dedicar mais ao Bittencourt Project e à minha carreira solo.
Quero diferenciar mais o que eu faço na minha carreira solo e no Angra. Para a
banda quero focar nos projetos internacionais, heavy metal cantado em inglês
pra ser tocado com sofisticação no Japão, na Europa e pelo mundo. Já meu
projeto solo é dedicado ao Brasil, ao público brasileiro especificamente e à
America latina. Quero cantar em português e falar das nossas coisas sem as
molduras do heavy metal. Quero fazer um rock mais livre, mais despojado, com a
mesma paixão e seriedade do Angra.
Agora que o Kiko está ocupado com o Megadeth eu não
pretendo seguir com o Angra sem ele, mas acredito que esta será uma boa
oportunidade de me dedicar mais aos meus sonhos pessoais e à minha carreira solo.
E sobre um sucessor do Brainworms I, tenho a dizer o
seguinte: já se passaram sete anos da gravação desse álbum e eu mudei muito
como artista e como pessoa. Minhas ideias já são bem diferentes, então decidi
gravar um DVD pra justamente retratar o processo desde as músicas do disco de
2008, tocando elas ao vivo pras pessoas como elas soam hoje, e também mostrar
um pouco das vontades que eu tenho dos caminhos a serem tomados para o futuro.
07 -
Em setembro você participou do terceiro tributo ao saudoso Wander Taffo. Como
surgiu a oportunidade e qual a sua ligação com a música dele?
Rafael:
A
minha ligação com o Wander Taffo começou na EMT (Escola de Música e Tecnologia)
fundada por ele. Lá tive a oportunidade de me aproximar mais dele e fortalecer
um laço de amizade. Hoje todas as vezes que a Fátima Taffo (irmã dele) realiza
estes tributos eu participo, pela minha amizade com eles, pela admiração que eu
tenho e pela minha vontade de manter vivo o talento dele e a memória da grande
pessoa que ele foi.
O Wander ainda é, certamente, um dos grandes unificadores
dos músicos do Brasil. Ao redor dele se reuniam músicos de jazz, fusion, samba,
rock, pop... Enfim, todos admiravam e cultivavam uma amizade com ele. O Taffo
foi importante pra cena rock e pra toda a cena musical brasileira por ter
polarizado especialmente na escola de música e tecnologia grandes músicos que
hoje são grandes guitarristas. Hoje eles são amigos por conta deste sonho do
Wander em ter todos juntos celebrando e admirando a grande musa, a música.
08 -
Com 25 anos de estrada você já deve ter passado por poucas e boas. Tem alguma
situação inusitada que você gostaria de nos contar?
Rafael:
Nesses
25 anos muitas coisas aconteceram. Tivemos um festival em Socorro/SP chamado “Rock
In Help”, uma alusão ao Rock In Rio, porém em Socorro, por isso o “help”
(socorro em inglês). E, realmente, o que nós precisamos ali foi de socorro,
pois choveu muito e o festival, que era uma parceria com a prefeitura, esperava
milhares de pessoas e pouquíssimas foram. Isso se deu porque era um festival de
rock e na época (já faz uns 20 anos ou mais) os festivais de rock não eram tão
populares, especialmente em pequenas cidades como Socorro.
Já tivemos de comer lesminhas em Taiwan por conta de
agradar o prefeito da cidade. Já fizemos turnê nos EUA em uma van e durante o
inverno americano nós mesmos dirigíamos com outros dois roadies e assistentes. Foi
um tremendo sufoco ter a banda inteira dentro de uma van pequena. Muitas vezes
algum dos membros peidava e tínhamos de suportar aquilo dentro da van fechada,
pois abrir a janela dentro de um nevoeiro era impossível.
E recentemente aconteceu algo indo de Paris para a Alemanha.
No aeroporto de Paris eu, o Kiko, o Bruno Valverde e nosso técnico de som Alexandre
Russo perdemos o voo da conexão e tivemos que alugar um carro e dirigir de
madrugada 900km de lá até Hamburgo em 7 horas. Fizemos isso a 180km/h pra não
perder a nossa participação no festival Wacken, algo muito importante.
09 -
Você é um cara irreverente (músicas como “Comendo Melancia” provam isso) e
muito amado pelos fãs. O bom humor é uma filosofia de vida para você?
Rafael:
Sim,
o bom humor é para mim uma filosofia de vida. Meu avô, Edgard de Moura Bittencourt,
foi um juiz e desembargador que escreveu muitos livros sobre o direito de família,
o concubinato, entre outros assuntos e era um cara muito sério no que fazia,
mas nunca deixou de ter bom humor. Isso e o amor pela vida era o que o guiavam
e nenhuma dessas duas coisas interferia na sua competência e na sua seriedade
em realizar suas atividades. A figura desse meu avô me inspirou muito em ser a
pessoa e o profissional que eu sou.
10 -
Deixe um recado para os fãs.
Rafael:
Quero
agradecer imensamente aos fãs, especialmente os que participaram da campanha da
produção do meu DVD no site da kickante. Estou agradecendo primeiramente a
esses fãs porque eles estão participando do meu DVD sem saber exatamente qual
será o conteúdo dele. Eles me apoiam de olhos vendados, às cegas, sem se
preocupar com a qualidade, porque eles confiam que a qualidade será boa e isso
me dá muita motivação.
11 -
Agora é a sua vez, pode me perguntar o que quiser!
Rafael: Minha
pergunta para você é quem paga pelas coisas que você quer e quem fabrica essas
coisas? Mais perguntas, das coisas que você quer, quais você realmente
necessita? E ainda, sobre as que você quer, é possível que você tenha sido
conduzido a acreditar que aquelas são as coisas que você quer? Estou curioso
para ver as respostas!
Bruno:
Bem, eu pago por elas na forma tangível (dinheiro) e intangível (assumo as
consequências) e, basicamente, os produtores estão relacionados com música e
cultura no geral, então vão desde os artistas (músicos, escritores, atores e
afins) até as fábricas de instrumentos, editoras, televisão, serviços de
streaming de vídeo, entre outros.
Das que eu quero, não podem faltar a música e os
instrumentos musicais de jeito nenhum! Ouvir as ondas sonoras e mensagens
produzidas por outrem e as produzidas por mim funciona como uma terapia.
Sobre ter sido conduzido, de forma alguma. Eu cresci numa
família de origem nordestina e na periferia, então tive (e ainda tenho) contato
com uma gama de gêneros musicais dos que realmente tem conteúdo, aos que dão
vergonha. O rock apareceu pra mim algumas vezes durante minha infância, mas de
forma bem branda. Quando entrei na minha adolescência, talvez pela rebeldia da
idade e porque eu sempre fui uma pessoa que questionava bastante tudo, eu
comecei a correr atrás de tudo relacionado ao gênero que dá nome a este site. O
rock’n’roll é algo que tomou conta do meu coração de forma natural.
Muito obrigado pela gentileza e atenção dispensada.
Grande abraço e muito sucesso pra você!
Dossiê do Rock: Revelando o passado. Incentivando o
futuro.